quinta-feira, 2 de novembro de 2017

JUBAL (1956)


Delmer Daves (n. 1904 – m. 1977) assinou alguns westerns relevantes, entre os quais 3:10 to Yuma/O Comboio das 3 e 10 (1957), com direito a remake em 2007, talvez seja o mais conhecido. Mas antes dessa obra, Broken Arrow/A Flecha Quebrada (1950), nomeado para três Oscars, é considerado uma obra-prima da reabilitação dos índios nas telas de Hollywood. Jubal (1956) é um outro belíssimo exemplo da inclinação de Delmer Daves para temas invulgares no universo western. Baseado numa história de Paul Wellman, escritor com vasto currículo na recriação literária do Velho Oeste, Jubal traz para o centro de acção o problema da infidelidade conjugal. O argumento exibe várias influências bíblicas, das quais o nome da personagem central é a mais evidente. No entanto, o Jubal interpretado por Glenn Ford transcende a conotação bíblica para se transformar numa verdadeira personagem trágica. Por um lado, sente-se obrigado pelo dever de fidelidade ao melhor amigo. Por outro, é tentado pela mulher desse amigo. No caldo do conflito, acaba por se afundar num pântano de traições, de ciúme e de inveja com o qual pouco tem que ver.

Vítima das circunstâncias, Jubal não se mantém desde o início inabalável nas suas convicções. Isso só acontecerá quando aprende a deixar de fugir do passado, do azar que o persegue, e se concentra em viver uma vida de verdade. Neste sentido, é um típico herói do western norte-americano. Mas o interesse de Jubal não está apenas na elevação do seu herói. A personagem interpretada por Valerie French justificaria por si só o filme. Mae Horgan é o símbolo da tentação numa quinta que poderia ser a terra prometida não fosse antes um inferno humano. Casada com Shep Horgan, o homem que acolhe Jubal Troop rapidamente o promovendo a capataz, Valerie deixou o Canadá em busca de uma vida próspera que nunca alcançou. O casamento com Shep revelou ser mais um passo a caminho do tédio. Valerie trai Shep com ‘Pinky’ Pinkum, o ambicioso cowboy da quinta de Shep que vê o lugar de capataz lhe fugir com a chegada de Jubal. Mas ‘Pinky’ também verá fugir-lhe Valerie, a qual passará a tentar junto de Jubal a história de uma paixão que nunca passará de sonho e de intenção.

A história de Jubal é, pois, a história de um homem só. Invejado por ‘Pinky’, desejado pela mulher do melhor amigo, acusado de traição por Shep, resta-lhe confiar na infiel Valerie para escapar a um linchamento público engenhado pelo seu principal inimigo. Mas Valerie não está menos só. Ela trai Shep com ‘Pinky’ e trai ‘Pinky’ com Jubal, traindo-se, sobretudo, a si própria sempre que nos braços de Shep aceita uma vida que nunca desejou. Ela ainda não aprendeu a enfrentar o passado, carrega-o como um fardo arrastando-o pelo presente. O fim trágico adivinha-se-lhe. Não como expiação, nem como sacrifício. A infidelidade de Valerie não é sequer julgada neste filme segundo padrões ancestrais que porventura à época seriam menos estranhos ao público do que hoje são certos acórdãos judiciais. Também a jovem Naomi Hoktor, filha do pregador de uma caravana parqueada nas terras de Shep Horgan, se apaixona por Jubal apesar de já estar prometida a um outro jovem. O fim trágico de Valerie é o fim de uma mentira da qual a sua própria vida é a expressão mais severa.


Jubal não é um western moralista, apesar do tom melodramático e do carácter humanamente inabalável do herói que lhe deu nome. É antes um filme que eleva a verdade a valor absoluto, colocando em personagens capturadas numa teia de mentiras e de infidelidades várias o desafio último de ou serem verdadeiras, e sobreviverem, ou insistirem na mentira, e acabarem mais mortas do que já estavam nas suas vidas insignificantes. 

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