quinta-feira, 5 de novembro de 2009

ROSAS DOBRADAS


«O meu nome atravessou sete gerações de homens com o mesmo nome. Cada um desses homens pôs o nome do pai ao primeiro filho» (in Crónicas Americanas, p. 60). Assim aconteceu com Samuel Shepard Rogers III, nascido em Fort Sheridan, no Illinois, a 5 de Novembro, ano da graça de 1943. O pai era militar da Força Aérea, combateu na II Grande Guerra e tornou-se, posteriormente, professor de espanhol. «O meu pai tinha o hábito de coçar uma cicatriz na nuca, que tinha sido provocada por estilhaços, sempre que ouvia um avião sobrevoar a nossa terra» (idem, p.150). Jane Elaine, a mãe, nasceu em Chicago, criou ovelhas, aturou as bebedeiras do marido. O pequeno Sam vingou-se na poesia e na bateria. Queria ser estrela numa banda de rock’n’roll, mas raramente saiu da garagem. Dedicou-se à escrita. A leitura de Beckett terá sido decisiva. Após alguns estudos agrícolas, juntou-se a uma companhia de teatro itinerante. Aos 19 anos chegou a Nova Iorque. Por aí ficou a servir à mesa, ao mesmo tempo que escrevia as primeiras de mais de quarenta peças publicadas e levadas à cena até aos dias de hoje. «Naquele tempo, costumava levar gelo à Nina Simone. Era sempre simpática comigo. Tratava-me sempre por “queriiido”» (idem, p. 102). Consegue uma bolsa da Rockefeller Foundation e uma bolsa Guggenheim, passando a dedicar-se inteiramente à escrita. Recebe os primeiros prémios, trabalha como argumentista e actor, escreve livros em prosa, sobretudo de pequenos contos, volta a sentar-se ao bombo para acompanhar os Holy Modal Rounders. Em 1969 casa com O-Lan Barna, de quem terá um filho. «Vejo o meu filho mexer-se, enquanto sonha / Enquanto dorme, de lado, numa cama de motel» (idem, p. 140). Já na década de 1970, colabora com Patti Smith na ópera rock Cowboy Mouth (1971). Abandona Nova Iorque na companhia da mulher e do filho, partem para Inglaterra, onde viverão até 1974. Iremos vê-lo a trabalhar ao lado de Michelangelo Antonioni e Tonino Guerra no argumento de Zabriskie Point (1970), aparecerá como actor no filme Days of Heaven (1978), de Terence Malick, aparecerá como actor em muitos outros filmes, ele próprio realizará as suas fitas, escreverá Paris, Texas (1984), para Wim Wenders, etc. e tal. Em 1983 separa-se de O-Lan e junta-se à actriz Jessica Lange, com quem vive desde então num rancho do Minnesota. Sam Shepard publicou as Crónicas Americanas em 1982, um ano antes de se separar de O-Lan Barna:


Rosas dobradas
Diz ela
Como em Inglaterra
Como outrora em Inglaterra

E mergulha
Bem no fundo de si mesma
Bem no fundo da Inglaterra

O seu nariz enche-se do perfume
Os seus olhos cerram-se
A Rosa é o navio
A Rosa é a casa
Outrora em Inglaterra


22/9/80
San Francisco, Ca.

Sam Shepard, in Crónicas Americanas, trad. José Vieira de Lima, Difel, 3.ª edição, s/d.

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